NOVO ASSALTO ÀS ÁREAS INDÍGENAS DA AMAZÔNIA - I

A guerra Rússia-Ucrânia trouxe consequências para o nosso país. Entre elas a interrupção do fornecimento de fertilizantes, em especial, o potássio de Belarus, aliada dos russos.

As empresas de mineração, nacionais e multinacionais e os governantes não se abalam com isto. Ao contrário, estão eufóricos. É a desculpa que precisavam para avançarem, desta vez, sobre o território dos índios Mura e Munduruku de Autazes e Nova Olinda do Norte, depositários deste mineral. Os empresários exploradores do potássio e governo, esperam obter grandes lucros, não importam os prejuízos que causarão a estes povos.

Lembremos que há poucos meses iniciou o saque do gás do município de Silves. Comboios de carretas com gás provindo de Silves passam diariamente, aqui, pela BR-174, em frente à minha casa, rumo a Roraima. Fala-se de 20 carretas por dia.
Já em sentido contrário, seguem, diariamente, saindo das minas do Pitinga, em nosso município, em torno de 400 caçambas de minérios estratégicos, os mais cobiçados do mundo. E desde o início dos anos 80, venho denunciando esse saque da Mina do Pitinga, efetivada pela Mineração Taboca. O que fica para o povo local, são rodovias, estradas e ramais esburacados, ameaçadoras barragens de rejeitos e áreas devastadas, com um solo inutilizado. E a morte. É o que sentiu na pele o povo Waimiri-Atroari.
E como areia nos olhos do povo local, ficam os memoriais homenageando os responsáveis por este crime: Município de ‘Presidente Figueiredo’, Escola ‘Otávio Lacombe’, Escola ‘Nelson Dorneles’, Escola de Mineração ‘Gilberto Mestrinho’, Escola Estadual ‘Amazonino Mendes’....
Para o povo do Estado de Minas Gerais quais foram os reais benefícios que as minas gerais lhe trouxeram? Inumeráveis prejuízos. Só na ultima década mais de 500 mortos por rupturas de barragens de contenção de rejeitos minerais, a “veia aorta” do Estado, o Rio Doce, com seus recursos hídricos inutilizados para consumo de qualquer ser vivo. E os recursos financeiros estão estocados, por ricaços, em bancos e paraísos fiscais...
A História do Brasil nos ensina que os governos que aqui se instalaram desde 1500, a partir dos portugueses, ainda não conseguiram ver e aceitar a existência da gente originária, dos reais donos deste chão. Seus olhos míopes só enxergam algo através da mesma peneira garimpeira do Pero Vaz de Caminha:

(Os índios) “Entraram. ... um deles pôs olho no colar do Capitão, e começou de acenar com a mão para a terra e depois para o colar, como que nos dizendo que ali havia ouro. Também olhou para um castiçal de prata e assim mesmo acenava para a terra e novamente para o castiçal como se lá também houvesse prata
Viu um deles umas contas de rosário, brancas; acenou que lhas dessem, folgou muito com elas, e lançou-as ao pescoço. Depois tirou-as e enrolou-as no braço e acenava para a terra e de novo para as contas e para o colar do Capitão, como dizendo que dariam ouro por aquilo.(...)
“Falava, enquanto o Capitão esteve com ele, perantenós todos, sem nunca ninguém o entender, nem ele a nós quantas coisas que lhe demandávamos acerca de ouro, que nós desejávamos saber se na terra havia.”
Isto tomávamos nós assim por assim o desejarmos. Mas se ele queria dizer que levaria as contas emais o colar, isto não o queríamos nós entender, porque não lho havíamos de dar. E depois tornou as contas a quem lhas dera.”


Alguma diferença de atitude e de visão quando olhamos para os objetivos dos governantes contemporâneos? Seus olhos não enxergam seres vivos, procuram “almoxarifados” de riquezas: de ouro, prata, nióbio, tântalo, ítrio, colúmbio, criolita, potássio, pau-brasil, especiarias, borracha, madeira de lei, correntes de água para produção de energia elétrica, para cidades e indústrias. O dono da terra que reclamar e não colaborar no saque, não deve existir, precisa desaparecer. E para isto vale tudo: a “mentira”, cria-se “descobridores”, “falsos donos”; o “preconceito” contra a sua cultura, contra seu modo de vida, contra sua ciência milenar... Aos sobreviventes fica, como única alternativa, a “integração à sociedade nacional”, que passa pela “desintegração”, ou seja, pelo etnocídio. E quando os governos são pressionados a devolver um pouco de dignidade, criam-se leis e mais leis, PECs e PLs que acabam em novas maneiras de oficialização da ganância do invasor.

O que se reserva para os Mura de Autazes e os Munduruku de Nova Olinda do Norte, para além do saque de suas riquezas, é a destruição de dois povos com uma História altiva em defesa da Amazônia, (O povo Mura sustentou por mais tempo a luta dos cabanos contra os saqueadores da Amazônia), a depredação de seus castanhais e florestas, a contaminação do seu território, endemias e doenças se proliferando e um solo alterado. No caso, algo extremamente grave vai ocorrer a toda a população da área. Ao que se sabe a extração do potássio de Autazes, exige a remoção de uma camada de sal que será depositada na superfície. Levada pelo vento irá contaminar toda a região.

Isto não é uma vergonha para os governantes? Isto não é uma covardia? Isto não é uma incoerência com os princípios cristãos que supostamente norteiam os invasores? Isto não é uma estagnação histórica?Ceterum censeo - de resto eu penso: a mineração como está sendo feita no Brasil, só traz prejuízos para o povo do país. Por isso, deverá ser suspensa e planejada sobre um modelo que traga, primeiramente, benefícios para a população local.

Casa da Cultura do Urubuí, 9 de março de 22,
Egydio Schwade

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