Especial 50 anos do CIMI - MEUS PRIMEIROS 10 ANOS DE MISSÃO INDÍGENA - Egydio Schwade

 Durante todo o meu currículo escolar jesuítico eu havia sido um aluno medíocre. Mas durante o Curso de Filosofia, com o incentivo do Pe. Arnaldo Bruxel, sj., cultivei meu gosto pela História e tirei 10, com louvor, no trabalho de conclusão da Filosofia. A direção dos jesuítas da Província do Sul do Brasil descobriu então a minha tendência e não pensaram outra: tem que fazer o Curso de Historia na Universidade Federal do Rio Grande do Sul. (aliás, a direção de toda a Igreja e consequentemente das ordens e congregações religiosas, pensam como todo o Governo Ocidental em função das necessidades urbanas, principalmente em função, no caso dos seus colégios e universidades.) Assim, no meu caso, tudo se configurava como um destino inexorável. Aí, segunda metade do ano de 1962, me defrontei com um drama vocacional que me fez recorrer a Roma. No íntimo eu questionava esta inexorabilidade, pois não foi isto que me trouxe à Companhia de Jesus, mas, sim, o desejo de servir em alguma missão, preferencialmente na África. Fiquei inteiramente só, pois na Província, todos, até os meus orientadores espirituais e amigos, eram unânimes: “não perca esta oportunidade, vá fazer esse curso de História, pois se é vontade de Deus que tu vás para as missões, Ele dará o seu jeito.” Entretanto, a minha fé não era tão grande como a desses meus conselheiros. Defrontava-me diariamente com o dilema: serviço aos mais necessitados ou cultivar o gosto pela História. Se fosse por este caminho, eu via-me condenado a ser professor ou historiador para o resto da vida. Para resolver o dilema, recorri a uma alternativa que a Companhia de Jesus nos dá: expor o problema ao Geral da Ordem que então era um irlandês. A resposta foi: Missão. Só que o Geral me acenou para a possibilidade de ir para a missão indígena de Diamantino/MT. Consolado, aceitei sem pestanejar. Dois meses depois estava iniciando o trabalho na Missão Anchieta/MT. E senti-me no serviço que sempre desejei. Nunca mais duvidei disso.

Cheguei à Missão Anchieta-MIA no dia 1 de janeiro de 1963. A situação dos índios era muito difícil. Índios abdicando de sua identidade e para se esconderem, buscavam a cidade. Missão indígena estagnada sobre o internato de Utiariti, para onde era levada a juventude tão logo o seu povo era contatado, como havia ocorrido recentemente com os Rikbaktsa dos quais vi jovens e crianças chegando com seus lindos enfeites sobre o corpo nu e no dia seguinte os vi “europeizados”, com roupas “civilizadas”, ajoelhados nos bancos da igreja. A Igreja missionária parada sobre as suas construções, não entendia a aflição desses povos. Doutrinar, europeizar e integrar objetivavam os Estados, tanto o Vaticano, como o Brasileiro.


O meu primeiro ano na Missão Anchieta/Prelazia de Diamantino/MT, passei no internato de Utiariti, onde vivenciei momentos de intensa alegria, mas também os absurdos, contradições e incoerências próprios das missões da época pré-conciliar, sem saber como tomar alguma atitude para superá-las. Mas em Utiariti tive um bom companheiro, na pessoa do superior, Pe. Arlindo Oliveira, sj. com quem discutia quase toda a noite o trabalho perambulando ao longo das águas límpidas do Rio Papagaio. Homem muito prático, mas carinhoso com os índios. Algumas vezes, também tive oportunidade de ter boas conversas com o Pe. Adalberto Pereira, sj, antropólogo, que nos abria o horizonte em sua área. Depois de Utiariti passei ainda dois anos em outro internato na cidade de Diamantino. Este não era só para indígenas, mas também para meninos pobres do interior: filhos de agricultores e garimpeiros. Em Diamantino fiquei a sós com os meninos, durante dois anos, sem poder avaliar com ninguém o trabalho. Mas foi ali que comecei a pensar de forma nova, todo o trabalho dos jesuítas e da Prelazia de Diamantino.


Em fevereiro de 1966 cheguei a São Leopoldo para iniciar a Teologia, ansioso por comunicar aos colegas que haviam vivenciado o mesmo drama naquela Missão, o meu plano de mudar os destinos da Missão Anchieta-MIA. Já no dia 9-3-66 escrevi carta de três páginas ao Superior religioso da MIA, Pe. Henrique Froehlich, expondo-lhe, em traços gerais, a proposta. Apontava para a necessidade de “sabermos ser arrojados na realização de planos globais da Missão orientados à luz dos ensinamentos de Jesus e do Vat. II. Planos que atinjam o homem no seu interior e nos seus problemas da vida cotidiana.” Colocava isto como a “principal fonte de vocações sobre as quais toda a Igreja estava preocupada.(...) estabelecer um planejamento concreto, de longo alcance para a Missão, nos quais possamos engajar com antecedência qualquer nova vocação boa que se apresente. Não devemos temer de nos aventurarmos a grandes novas empresas – mesmo que estas não agradem aos daqui”...(Província) “O que devemos temer é nos cimentarmos em belos colégios, desajustados às condições do povo que evangelizamos.”


No dia 18 de março, com o plano discutido e assumido pelos demais companheiros da Missão Anchieta, estudantes de Teologia em São Leopoldo, o enviamos a todos os membros da Prelazia. O plano tinha dois pontos básicos. 1. Parar os trabalhos da Prelazia e nos dedicarmos prioritariamente à atração dos índios isolados e ao reconhecimento do território da Prelazia que na época tinha 354.000 km2. 2. Levantamento sócio-econômico e religioso total. Vivíamos intensamente a vontade de colocar em prática o Vaticano II e esmiuçamos as razões do plano na perspectiva deste. Obtivemos poucas respostas. E as poucas que chegaram, foram lacônicas e contra.


Vendo o nosso plano rejeitado pelos companheiros em campo, Thomaz Lisboa (que se tornara o meu inseparável companheiro de sonhos e ação) e eu, partimos para outro rumo. Achamos que seria difícil mudar algo com o quadro missionário da Prelazia e pensamos na entrada de leigos, não como tapa-buracos, mas como companheiros que pudessem pensar conosco a mudança. Tomamos contatos com jovens católicos e evangélicos (dentro dos princípios do ecumenismo proposto pelo Vat. II) em São Leopoldo e arredores, expondo o nosso plano de ação. Obtivemos adesões entusiastas, mas não conseguimos concretizar a formação de nenhum grupo, durante os três anos que estudamos juntos em São Leopoldo.


Convém observar que eu era então extremamente tímido, ao contrario do Thomaz Lisboa, cujo forte era empurrar logo para ação planos e sonhos que nos vinham abundantes na cabeça. A semana santa de 1967 passamos, Thomaz e eu, com os índios do Rio Grande do Sul. Sem que conhecêssemos uma só aldeia, viajamos a sua procura, iniciando por Nonoai. Naquela semana visitamos 5 toldos, como são conhecidas as áreas indígenas no Rio Grande do Sul. Voltamos tristes com a lamentável situação que encontramos e escrevemos 9 artigos, publicados pelo jornal “Correio do Povo” de Porto Alegre, sob o título: “Drama de 1080 famílias indígenas riograndenses”/maio/1967. O quadro apresentado chocou a opinião pública e depois do 3º artigo a Assembléia Legislativa criou uma Comissão Parlamentar de Inquérito-CPI para apurar as denúncias. Fomos chamados a depor. Como o Rio Grande do Sul era então o único estado que ainda tinha serviço estadual de proteção aos índios, 4 reservas estaduais (reminicência da estadualização da política indigenista do período anterior à 1910 e que “integrou” ou acabou com quase todos os povos indígenas dos estados da costa leste brasileira) e 4 federais, a CPI provocou uma polêmica entre os dois serviços que resultou na Comissão Parlamentar de Inquérito na Câmara federal, presidida por Jader Figueiredo e que terminou com a extinção do Serviço de Proteção aos Indios-SPI e a criação da FUNAI, em dezembro daquele ano de 1967. Todos esperávamos uma real mudança na política indigenista oficial. No mesmo ano levamos o primeiro líder indígena, Juvêncio de Paula, cacique do toldo de Votouro, para que ele mesmo relatasse a situação do seu povo. A sua apresentação foi um sucesso total.


No início de 1968, durante as férias, voltei para a Missão Anchieta a convite do vigário de Porto dos Gaúchos, a fim de fazer um levantamento da população de sua paróquia. Com outro colega estudante jesuíta, descemos o Rio Arinos, território dos índios conhecidos como Beicos-de-pau. A certa altura os índios lançaram flechas contra nossa embarcação. Uma caiu a um metro de mim. Após o levantamento em Porto dos Gaúchos que durou um mês, voltamos pelo mesmo rio Arinos. Bem mais acima do local onde os Beicos-de-Pau ou Kanê, haviam flechado, um outro grupo dos mesmos índios arredios, se apresentou pacificamente na margem do rio. Alguns tripulantes jogavam roupa, enquanto os índios ofereciam cestas e colares e com gestos pediam que o barco encostasse. Mas o dono, receoso, apenas passou rente, evitando encostar.


Preocupado pelos índios, temendo que algum irresponsável se aproveitasse dessa situação e fosse contatar o grupo levando-lhes doenças, procurei em Diamantino/MT o Superior Religioso dos jesuítas e tentei convencê-lo a enviar imediatamente algum missionário para que contatasse o grupo e ficasse com ele, animando-o a permanecer na sua aldeia, afastado do rio. Os superiores alegaram que não tinham ninguém disponível. Prontifiquei-me, então a interromper a Teologia, para ir. Não mo permitiram. Deixei ainda uma carta manuscrita, bastante dura, manifestando a minha preocupação e alertando os responsáveis da Missão Anchieta sobre o perigo que os índios corriam, expostos a contatos indiscriminados de aventureiros que não faltavam na região.


Ali mesmo, em Diamantino, antes de voltar para o Sul, recebi convite do Secretário Nacional do SNAM da CNBB, Pe. Lourenço Soonsbeck, para participar de um encontro de Missionários indigenistas de diversas Prelazias, para fevereiro em Morumbi/SP. Foi o início dos novos rumos, dentro da Instituição e que após reuniões anuais, desembocou em 1972 na criação do CIMI. No encontro ficou claro que um dos entraves principais à mudança que se fazia necessária nas missões, eram os próprios superiores das províncias e missões religiosas. Todos sentiam que se deveria enfrentar essa situação com nova visão da obediência. Em meio a uma acalorada discussão, o salesiano, Pe. Angelo Venturelli, preocupado com esta perspectiva reboou o seu vozeirão: “E onde fica, então, a obediência religiosa?” Em resposta Frei Gil Leitão, dominicano, missionário junto aos Suruí do Pará e que conheci ali, em Morumbi, nos deu esta inesquecível lição: “Obediencia, sim, mas obediência criativa!” - retrucou ele. E relatou um exemplo de sua própria vida para ilustrar o sobredito. “Certa vez os meus superiores me chamaram da Missão para atender uma comunidade de freiras em Uberlândia/MG. Obedeci, mas logo percebi que aquela comunidade não necessitava de mim. Todas eram santas e tinham tudo o que necessitavam. Arrumei, então, as malas e voltei aos Suruí, que precisavam de minha presença.”  Neste encontro D.Tomás Balduíno, embora ausente, foi sugerido para ser “bispo pessoal” dos índios. Mas a idéia de “diocese pessoal” para os índios não evoluiu e foi abandonada com a criação do CIMI.


De Morumbi/SP voltei a São Leopoldo/RS, onde cursava Teologia. Ali voltei a apresentar ao colega Pe.Thomaz Lisboa o meu drama de consciência a respeito dos Beiços-de Pau. Thomaz escreveu no mesmo dia aos superiores da Missão Anchieta, dispondo-se a interromper a Teologia. Argumentava que já era padre, (os jesuítas se ordenam no 3º. ano de Teologia) estando em condições para levar o trabalho avante, sem grandes prejuízos aos seus estudos. Também não lhe permitiram. Dois meses depois os aventureiros, João Américo Peret(FUNAI) e Fritz Tolksdorf (um alemão), convidaram um grupo de jornalistas de Fatos e Fotos e Cruzeiro, com os quais foram fazer o que denominaram de “pacificação” dos Beiços de Pau. Levaram aos índios a gripe, o que relataram, entre gracinhas e com detalhes, nos seus artigos. Resultado: em poucos meses esse povo, de aproximadamente mil pessoas, foi reduzido a 43. Esse acontecimento feriu a minha consciência e daí por diante não mais me orientei pelos caprichos de instituições insensíveis, procurando obedecer com criatividade, “antes a Deus do que aos homens”. (At.5,29)


Neste mesmo ano de 1968 os companheiros missionários de Missão Anchieta me nomearam para coordenar as questões supra-Prelazia. Foi nesta condição que contatei a direção da ICLB-Igreja Evangélica de Confissão Luterana do Brasil com sede em Porto Alegre/RS, para discutirmos a possibilidade de unir o trabalho missionário junto aos Rikbaktsa, em Mato Grosso, onde atuavam ICLB e jesuítas. Juntos concluímos que era melhor que os jesuítas assumissem o trabalho. A direção da ICLB se dispôs a continuar colaborando no que fosse preciso nesse trabalho missionário. (Mais tarde, já como secretário do CIMI, colaborei também no sentido inverso, quando o casal de pastores da ICLB, Lori Altmann e Roberto Zwetsch, assumiram na Diocese de Rio Branco o trabalho missionário na comunidade Madiha de Maronawa/Purus, onde prestaram um excelente serviço, com apoio de D. Moacir Grecchi.) Enquanto órgão oficioso da CNBB, o CIMI sempre primou pelo ecumenismo com a ICLB e outras Igrejas evangélicas.


Thomaz Lisboa terminou a Teologia em 1969 e voltou logo para a Missão Anchieta, ansioso por mudanças. Ficou superior de Utiariti e imediatamente acabou com o internato, animando os índios a voltarem para as suas aldeias e as missionárias e os missionários a os acompanharem. Sustentou uma “bronca” danada de todos os lados, principalmente das irmãs. Algumas até se negaram a ir trabalhar nas aldeias. Outras foram às aldeias, onde viveram até a morte ou vivem ainda hoje, muito mais felizes do que em Utiariti.


Fui ordenado padre em dezembro de 1968, no triste dia do AI-5. (Frei Beto que veio estudar com os jesuítas em São Leopoldo/RS e se levantava muito cedo, como eu, foi freqüentes vezes meu ajudante de missa naquele ano). Logo após a ordenação fui-me encontrar com jovens catarinenses, congregados marianos, reunidos no convento dos franciscanos em Rio Negro/PR, onde nasceu a Operação Anchieta-OPAN, hoje Operação Amazônia Nativa, em 5 de fevereiro de 1969. Já no ano seguinte, 1970, a OPAN, enviou os primeiros voluntários e voluntárias, católicos e evangélicos para as prelazias de Diamantino/MT e Guajará-mirim/RO, iniciando um novo caminho da Igreja Missionária. De 1970 a 1980 enviou dezenas de jovens às comunidades mais carentes e abandonadas das prelazias de Diamantino, Porto Velho, Guajará-Mirim, Rio Branco, Cruzeiro do Sul, Lábrea, Humaitá, Tefé, Alto Solimões e Roraima, desencadeando um novo modelo de missão junto aos povos indígenas mais abandonados da Amazônia. Os voluntários da OPAN eram iniciados em um curso no Sul e outro na Missão, junto com os companheiros(as) religiosos(as). Chegando às aldeias com muita simplicidade, seja nos seus trajes, seja nas atitudes, esses jovens tiveram, em sua maioria, muito boa aceitação dos índios e bom entrosamento com os missionários. Nas aldeias se misturavam com a situação dos índios, sem exigências especiais e fora dela, na cidade, o abrigo de um era o mesmo do outro, rompendo a tradicional discriminação reinante, seja entre missionários e leigos, seja entre missionários e índios. Ninguém doutrinava. A palavra de ordem da OPAN era: encarnação. Sua sede em Cuiabá virou um dos centros de irradiação dos novos rumos da Igreja missionária. Ali, índios, opanistas, padres e bispos de frente, igualados, discutiam em encontros informais e formais. Foi sob este impulso que a mudança se implantou nas missões do Centro Oeste e Norte do País, entre 1970 e 1973 e que garantiu, depois ao CIMI uma força de expansão que até hoje, em parte, ainda está presente em sua ação de base. (Ivar, Rosa, Ivo, Antonio, Chico, Egon, sem dúvida, estão entre os missionários indigenistas que mais se destacaram no impulso da ação indigenista do CIMI nas áreas mais difíceis do Sul, Norte e Centro Oeste. Doroti, minha companheira de indigenismo durante 32 anos, foi a primeira coordenadora do CIMI-Amazônia Ocidental, entre 1976 e 1978 e coordenou a implantação da ação indigenista da Igreja nas Prelazias Acre-Purus, Cruzeiro do Sul, Lábrea e Humaitá. Foram todas pessoas, decisivas na caminhada do CIMI e que entraram na missão indígena via OPAN).


Os missionários que se reuniram em Morumbi em 1968, continuaram se reunindo, todos os anos, mas com poucos avanços, já que o grupo nem crescia e nem se organizava.


Na segunda metade de 1971 chegou à Missão Anchieta o convite para um novo encontro de missionários em Brasília, para dar continuidade aos encontros que iniciaram em Morumbi. A insatisfação tomou conta dos jesuítas da Missão Anchieta/Diamantino. Além da estagnação frente às almejadas mudanças, entregara-se agora a coordenação dos encontros a um sacerdote recém-chegado de Roma que nem sequer participara das reuniões anteriores. A agenda que nos enviou mostrava que tudo voltaria à estaca zero. Diante disso, nos reunimos em Diamantino com o Bispo, que pediu ao Pe. Thomaz Lisboa e a mim, para acompanhá-lo no encontro dos Bispos do Regional/MT em Campo Grande, em novembro/71. Recebemos a incumbência explícita de propor aos bispos que ajudassem a pressionar a CNBB/Nacional a mudar a agenda da reunião dos missionários prevista para abril/1972. Os bispos do Regional nos solicitaram então que elaborássemos proposta de nova agenda para o encontro de Brasília. A proposta foi aceita e assumida pelos bispos do Regional/MT. No seu primeiro item propõem: “Que se efetive uma coordenação nacional corajosa, com conhecimento da situação real do índio, e representativa de uma visão com abertura nacional e até internacional da problemática.” Seguem os detalhes sobre o funcionamento dessa coordenação, veja SEDOC/abril/1972. A proposta foi aprovada pelos bispos que deram o devido encaminhamento, mas não foi aceita pelo encarregado do encontro. Diante disso, não nos restou outra alternativa, senão a pressão, já que a questão da criação de um instrumento de coordenação da pastoral indigenista que abrangesse o seu conjunto, fora unânime entre os participantes dos encontros anteriores.


Com dois dias de reuniões, sem nenhum interesse a não ser o pedido de que se partisse para a discussão esperada por todos, o encarregado do encontro, amargurado, abdicou da coordenação e deixou o encontro nas mãos dos participantes. Sem demora entramos na ansiada discussão na qual nasceu o CIMI, no dia 24 de abril de 1972 e elegemos o primeiro conselho. Aconteceu que a primeira votação levou três companheiros da Prelazia de Diamantino para o conselho, ficando outras sem nenhum representante.  Por outro lado, desde o encontro de Morumbi os olhos de muitos missionários, inclusive de nós jesuítas de Mato Grosso, acompanhavam a atuação indigenista de D.Tomas Balduino. E como o único bispo escolhido para integrar o Conselho foi o bispo jesuíta de Diamantino, D. Henrique, achávamos que ele deveria ceder lugar a D.Tomás para integrar o Conselho. Por isso, após a 1ª. votação nos reunimos com D. Henrique, propondo-lhe sua renuncia em favor de D. Tomás, no que ele concordou de imediato. Na sessão seguinte apresentamos a proposta dando como razões um equilíbrio maior na participação das dioceses e prelazias. Mas tínhamos também outros motivos...  D.Tomás só aceitou sob a condição de que fosse por eleição. Fez-se nova eleição e Tomás foi o eleito.


O primeiro Conselho foi formado, em sua maioria, por especialistas na questão indigenista, mas, deixou a ação e causa dos missionários cair na estagnação. A sua ação naquele ano, praticamente se restringiu à discussão de um novo Estatuto do Indio, que aliás, apresentava muito pouca novidade, sobre aquele dos militares, que naquele ano entraria em vigor (julho/73). A insatisfação continuou e fez-se refletir principalmente sobre o Secretariado Nacional da CNBB, dirigido por D. Ivo Lorscheiter. D.Ivo propôs, então, que o Conselho se reunisse e criasse um Secretariado Executivo a exemplo da CNBB. Naquele ano eu havia deixado a direção da OPAN, onde atuei como Coordenador Técnico, entre 1969 e 1973. Estava voltando para as bases indigenistas do Noroeste de Mato Grosso, quando recebi convite de D. Ivo e de alguns conselheiros do CIMI, para participar da reunião do CIMI. Nesta reunião, no 30 de junho de 1973 foi criado o Secretariado Executivo do CIMI, do qual fui escolhido como secretário executivo.


No segundo mês de meu mandato à frente do secretariado, o Pe. Venturelli se demitiu da presidência do CIMI, alegando discordar da linha que eu havia impresso ao órgão, manifesta no Boletim do CIMI Nr. 03.


Por sugestão de D. Ivo, o Cimi se tornou um órgão oficioso, não oficial, da CNBB. Uma estratégia sábia para manter a sua liberdade, agilidade e devida distancia do poder dos bispos e dos superiores das congregações religiosas.


Casa da Cultura do Urubuí,

Egydio Schwade 

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