Reunião no Seminário do Passo Fundo - Egydio Schwade

 Em maio de 1967 Pe. Thomaz Lisboa e eu publicamos 9 artigos sobre a situação dos índios no Rio Grande do Sul. Em consequência, a Assembleia Legislativa criou uma CPI para apurar os fatos. Durante os trabalhos da CPI foi descoberto e denunciado que o arcebispo D. Vicente Scherer de Porto Alegre e o bispo D. Cláudio Colling, de Passo Fundo, haviam recebido cada um 100 pinheiros para construção de seus seminários. Pinheiros, retirados pelo Serviço de Proteção aos Índios-SPI, de áreas indígenas do Rio Grande do Sul.

Numa reunião dos Bispos do Sul-III da CNBB, os dois bispos reclamaram do Provincial dos jesuítas, providências para nos reprimir. Foi o que o Provincial fez em carta a nós. Entretanto, pouco depois, D. Ivo Lorscheiter, então secretário do Sul III,  nos solicitou que organizássemos um encontro de Pastoral Indigenista, para padres e freiras de regiões próximas às áreas indígenas do Estado. Apresentei-lhe então a dificuldade de que não éramos as pessoas mais indicadas para isto, como ficou claro pela reclamação dos dois bispos e da reprimenda do Provincial. Mas D. Ivo com a sua normal tranquilidade me disse: “Eu ouvi a lamúria daqueles bispos. Mas vocês  vão organizar, sim, este encontro e vai ser lá no Seminário de D. Cláudio em Passo Fundo.”

Durante o encontro, assessorado pelo Pe. Adalberto Pereira, sj. missionário da Missão Anchieta de Mato Grosso, se discutiu muito a situação da invasão das áreas indígenas do Estado por agricultores. Quase todo o tempo quieto, um capuchinho, vigário de Cacique Doble, como que despertou a certa altura e disse: “Sim, eu estou pensando muito sobre este assunto. Acho que se deveria distribuir estas terras dos índios aos agricultores. Os índios adultos não tem mais jeito, mas as criancinhas, coitadinhas, se poderiam dar para as irmãs criarem em seus educandários.” Participavam do encontro também lideranças indígenas convidadas por nós. Entre elas, o cacique, Juvêncio de Paula, da área de Votouro. E o Pe. Adalberto se voltou para ele e lhe perguntou: “Então, Juvêncio, você estaria disposto a entregar os seus filhos para as irmãs?” Juvêncio, sério vagarosamente, quase soletrando, retrucou: “Acho que não, porque os meus filhos não são criação!?”

Casa da Cultura do Urubuí,

Egydio Schwade


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