A NULIDADE DOS TÍTULOS DE PROPRIEDADE DOS “PAULISTAS”
Por iniciativa de um vereador do município de
Presidente Figueiredo, está rodando pelas comunidades do interior um Abaixo-Assinado
contra uma decisão da Juíza Federal, Dra. Jaiza Fraxe. É preciso deixar claro,
antes de tudo, que a decisão da Juíza pode acarretar a anulação dos títulos dos
grileiros paulistas, que a muitos anos atrapalham a vida dos indígenas e
agricultores das comunidades do município. São 266 títulos de 3.000 hectares
cada um.
É preciso que as autoridades se coloquem a par da
História do seu município. É preciso que conheçam o sofrimento imposto pela
Ditadura Militar aos índios com a passagem da BR-174. É preciso que conheçam a
história de sofrimento imposta às comunidades de agricultores mediante o uso de
títulos nulos, herança de corrupção, para que não repitam, corroborem e
continuem este sofrimento, com as mesmas atitudes e ações do século passado.
Venho acompanhando a questão desde que cheguei ao Estado
em 1980 e, como cidadão amazonense, tranquilizo os agricultores. Quem tem a
temer esta decisão da Juíza Federal, são aqueles que vêm perseguindo e
ameaçando as comunidades. O documento da Juíza reforça a nulidade dos títulos
dos grileiros paulistas, que tanto atrapalham a vida das comunidades. Está aí o
exemplo da comunidade Terra Santa, no Km 152 da BR-174, que há 6 anos vem solicitando
a nulidade dos títulos dos grileiros paulistas pois, um madeireiro, montado num
desses documentos fraudulentos, pressiona e persegue a comunidade, com ameaças e
violência. Estes grileiros e madeireiros devem temer!
O documento da Juíza demonstra a nulidade dos
documentos fornecidos pelo Governador Danilo Areosa, em 1971 à pessoas sem
interesse algum em investir no Estado, mas sim, em se apropriar de Bens da
União e do dinheiro dos Incentivos Fiscais. O reconhecimento da nulidade desses
documentos pelas autoridades competentes se vem arrastando à décadas, com a
conivência dos governadores, inclusive do atual, prejudicando as comunidades
indígenas e dos pequenos agricultores.
Por que são nulos os títulos dos “paulistas”? Entre
outras razões:
1.
Porque lhes foi
negada já no dia 24 de fevereiro de 1971, pelo então Presidente da Funai, Gal.
Bandeira de Mello, a “Certidão Negativa” da presença indígena. Documento, à
época, exigido para qualquer empreendimento novo na Amazônia. O documento lhes
foi negado, porque as terras eram ocupadas pelos Waimiri-Atroari.
2.
Não bastasse isto,
não houve nenhuma demarcação efetiva dessas terras para estes grileiros, ao
contrário, sua delimitação foi feita apenas em escritórios e cartórios que se
prestaram à ilegalidade, onde os grileiros chegaram a se apropriar até dos rios
da região, como é o caso do Rio Uatumã.
3.
Além disso, a lei
de terras do Estado do Amazonas, de 1959, determina que as terras concedidas ou
vendidas pelo Estado, deveriam ser ocupadas com cultura efetiva. Mas, como
sabemos, nenhum grileiro ocupou a terra.
4.
Esses títulos
foram adquiridos com evidente intensão de fraudar o Estado. É o caso dos
títulos de lotes localizados sobre o futuro lago de Balbina. Foram concedidos quando
os trabalhos da Hidrelétrica já estavam projetados. Os grileiros paulistas visaram
apenas obter vantagem indenizatória com o enchimento do lago.
A pretensão dos índios é a mesma que a das comunidades,
ou seja, a declaração de nulidade dos registros de propriedade desses grileiros
“paulistas”. Assim, a campanha do vereador, confrontando o documento da Juíza
Fraxe, está fora da realidade ou de interesse politico. Não se pode imaginar
que uma autoridade deste município não tenha conhecimento do sofrimento imposto
às comunidades nos últimos anos, pela ação dos “laranjas” desses “paulistas”. As
terras da União e do Estado estão sendo saqueadas, sem favorecer devidamente a
população local, como é o caso da Mineração Taboca e da Fazenda Cristo Rei.
A comunidade Terra Santa é um caso exemplar das
injustiças que pesam sobre as comunidades, vitimas daqueles títulos nulos. Quando
a comunidade já estava há 9 anos instalada, um madeireiro teve acesso aos
documentos dos “paulistas”. De posse do documento e protegido da Secretaria
Municipal de Meio Ambiente, o madeireiro se tornou um perseguidor da comunidade.
Entrou na Justiça Estadual onde conseguiu mandado de despejo da comunidade
Terra Santa. Esta iniciou então uma luta para reverter o mandado, luta que
continua até hoje e em meio a qual já foram injustamente despejados as mais esclarecidas
lideranças, inclusive, o seu Presidente, Valdomiro Machado. Sempre buscando a verdade,
se dirigiram aos órgãos públicos afins: Polícia (onde já registraram mais de 20
BOs de queixas contra o madeireiro), Defensoria, MPF, Corregedoria e
Procuradoria Geral do Estado... onde obtiveram provas suficientes para
continuar a sua luta contra as pretensões do madeireiro da Fazenda Cristo Rei. Hoje,
o madeireiro, assina o abaixo-assinado, camuflado, em pretenso defensor dos
direitos da comunidade, usando a comunidade como “bucha de canhão” contra a
decisão da Juíza Federal. Sua assinatura está aí porque de fato é o único
interessado na manutenção dos títulos dos “paulistas”. O Abaixo-assinado é uma estratégia
para a manutenção da ilegalidade.
Em verdade, a Juíza Jaiza Fraxe, desencadeou um
processo de reconquista das terras afetadas pela herança maldita de um período
de ocupação fraudulenta que atingiu duramente todo o povo, não somente da
Amazônia, mas de todo o país. De um lado a Lei dos Incentivos Fiscais e do
outro a transferência das terras para ladrões profissionais.
Por isso, é preciso que continue a luta dos
Waimiri-Atroari e de seus aliados, bem como das comunidades do interior do
município de Presidente Figueiredo. Todos juntando forças pela anulação dos
títulos dos grileiros paulistas, herança da violência e da corrupção do Regime
Militar e hoje servindo aos saqueadores das riquezas naturais, em especial, a madeira
e os minérios, além serem instrumentos de perseguição das comunidades rurais.
A iniciativa da Juíza Federal, Jaiza Fraxe,
corroborada pelos estudos de outros órgãos públicos, como as Defensorias, o
MPF, Corregedoria e Procuradoria Geral do Estado, se reveste no momento de
particular importância na luta das comunidades rurais e indígenas. A iniciativa
exige que as terras griladas retornem a seu destino original, como terras da União
ou do Estado, de onde foram roubadas. A nulidade dos títulos leva a discussão sobre
essas terras a novos patamares para lhes dar o destino justo.
Casa da Cultura do Urubuí, 18 de julho de 2016,
Egydio Schwade
Comentários
Postar um comentário