MUNICÍPIO DE PRESIDENTE FIGUEIREDO: O KWAIT BRASILEIRO - I



As origens do município 


Em 1967 os donos desta região, os índios Waimiri-Atroari, ou Kiña, como se autodenominam, começaram a ouvir RUÍDOS ESTRANHOS INVADINDO A SUA FLORESTA, colocando as arvores de raízes para o ar. Eram as máquinas do Governo do Amazonas construindo a BR-174, pelo seu território como se este fosse um vazio demgrafico.

Esta rodovia não foi propriamente construída para ligar Manaus a Boa Vista, como o povo humilde do Amazonas e de Roraima, imaginavam. Seu principal objetivo era obter acesso às reservas minerais. No ano de 1967 o governo traçou um plano para a região que objetivou a exploração do minério, como comprovam documentos que originaram a rodovia BR-174. Antes de iniciar as obras, o diretor do DER/AM-Departamento Estadual de Rodagem do Amazonas, Coronel Mauro Carijó, solicitou da Petróleo Brasileiro S/A – PETROBRÁS, “informação sobre o potencial mineral do Estado em vista da elaboração de um Plano Diretor de Transportes para o Estado do Amazonas”.  (1). Foi assim que se optou iniciar a BR-174. O impulso para a sua construção veio principalmente do governo americano que melhor do que o brasileiro já conhecia as minas da região.

Desde os anos 40 há indícios de que a região ao Norte de Manaus e Sul de Roraima era cobiçada pelos norte-americanos devido às suas riquezas minerais. A exploração de castanha, borracha, pau-rosa na região, cedia lugar aos interesses minerais. Em 1944, aproveitando o turbilhão internacional provocado pela segunda guerra mundial, o governo Norte-americano encarregou o “4th Photo Charting Squadron”, sob o comando dos oficiais, Tte. Walter Williamson e Sargento Baitz, para fazer o levantamento aerofotogramétrico das bacias do rio Alalaú e do rio Uatumã. Mas no dia 05-10-44 os Waimiri-Atroari surpreenderam a expedição norte-americana fazendo pesquisas na Cachoeira Criminosa rio Alalaú. A expedição tinha autorização e apoio do governo brasileiro. Os índios Waimiri-Atroari, porem, os consideraram invasores de suas terras e massacraram a expedição, matando os dois oficiais americanos e os seus auxiliares brasileiros, com exceção de um só. (2) A seleção dos rios Uatumã e Alalaú pelos americanos evidentemente tinha a ver com os minérios estratégicos ali existentes. 

Por isso, a presença norte-americana na região não parou neste trágico episódio. Continuou através de “Asas de Socorro”- aviões e pilotos norte-americanos a serviço de seitas ianques, acólitos dos mesmos interesses. Em 1945 missionários americanos da Unevangelized Field Mission, no Brasil conhecida como Missão Evangélica da Amazônia (MEVA), contataram os Wai Wai, um povo de língua Karib, como os Kiña, habitantes da região ao Norte destes, em ambos os lados da Fronteira Brasil-Guiana, iniciando um processo de descaracterização cultural daquele povo, através dos quais procuravam penetrar no território Waimiri-Atroari. Apesar das constantes denúncias, inclusive de funcionários da FUNAI, contra a MEVA, como “acobertadora de contrabando de minério” e de “catequese que leva os (Índios) a autodestruição cultural e física” e de “interferência na política oficial”, esta missão sempre foi protegida pela política indigenista do governo brasileiro: SPI, Funai e Ministérios afetos, com íntima colaboração de ambos os lados. 

Assim, por exemplo em agosto de 1969, o presidente da FUNAI, Queirós Campos e o então Ministro do Interior Costa Cavalcanti, assinaram convênio com o Summer Institut of Linguistics, órgão de missionários americanos do qual faz parte a MEVA, abrindo a este Instituto as portas de todas as áreas indígenas, inclusive, a dos Waimiri-Atroari.

Na oportunidade do massacre de servidores da Funai no rio Alalaú, em outubro de 1974, o “O Estado de São Paulo’ em sua edição de 06-10-74 ao noticiar o massacre dos servidores da Fundação Nacional do índio –FUNAI, refere: “Gilberto Pinto, juntamente com o coordenador da FUNAI na Amazônia, (Porfirio Carvalho) continuam no local procurando os cinco desaparecidos, utilizando-se de aviões das missões protestantes, cujos pilotos, veteranos da segunda guerra mundial, conhecem minuciosamente a região”.(o grifo é nosso) (2)

Evidencia-se uma relação dos interesses minerais com o destino imposto ao povo Kiña através da política indigenista do Governo Brasileiro. O povo Kiña se tornou o principal “estorvo” para o Governo e as empresas interessadas na exploração das jazidas minerais e da energia. Um ‘obstáculo’ que tinha que ser removido. Acontece que, se antes de 1968, os interesses eram sobretudo regionais e adentravam a região por veios fluviais, possibilitando os índios a se refugiarem no alto dos rios e igarapés, agora o alvo se tornou a terra firme, em particular os divisores de água, por onde avançava a rodovia sobre as malocas cortando, sem respeito algum, os seus varadouros, rios e igarapés . No esforço de sobrevivência, apesar das armas desiguais, os Kiña mostraram-se, de fato, um vigoroso “estorvo” à essa política oficial genocida.

Onde está a mina do Pitinga havia ainda em outubro de 1968 9 aldeias Kiña, aerofotografadas naquele mês pelo Pe. João Calleri. E repetidas referencias e desenhos dos Kiñá em nossas aulas de alfabetização desse povo, confirmaram a presença de aldeias Kiña e Piriutiti ali. Todas foram varridas pela SACOPÃ, uma empresa de segurança formada e comandada por ex-agentes do DOI-CODI, do Exército ou da Polícia, com a explicita missão de “limpar a floresta”, acabando com os “estorvos” que eram os índios e ou pobres garimpeiros.(3) 

Mas para que a mina do Pitinga pudesse ser explorada e saqueada com tranquilidade pelas multinacionais que a cobiçavam, era preciso tomar ainda outras providencias. Era preciso separar esse território do Brasil e torna-lo um território sob o controle das multinacionais interessadas, tal como fizeram com o Kwait, separando-o do Iraque, para saquear a nata do petróleo daquele país.

Casa da Cultura do Urubuí, dia 25 de maio de 2018,
Egydio Schwade


(1) Carijó, Cel. Mauro, Diretor do DER/AM. Manaus, 30-10-1967.
(2) Jacobina, Alberto. 1ª. Inspetoria Regional do SPI. Relatório referente ao exercício de 1944. Manaus, 07-11-1944.
(3) Barros, Ciro e Barcelos, Iuri. Dos Porões às Agencias de Segurança Privada. Pública, 28-03-2017. 

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