Iasi: a Missão Cumprida de um Guerreiro
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Com a mesma lucidez e
perspicácia, sente a vida passar como um filme. “Quando a gente chega com
lucidez nessa idade, a vida vai passando na memória da gente como um filme.
Lembro-me desde os quatro anos”. Brinquei com ele: “Imagina que longa metragem
de 90 anos!”. Ele sorri. Começou a falar da família, da revolução na década de
trinta, da casa de comercio de seu pai, da falência, em função da crise
financeira, e de sua primeira matricula num colégio público em São Paulo, aos
sete anos de idade.
Passo mais de hora e meia com o sereno lutador, que mesmo
com algumas dores não se furta a puxar do fundo do baú de sua existência, fatos
e retratos marcantes de quem enfrentou, com ousadia destemida, os inimigos dos
povos indígenas, especialmente durante a ditadura militar. Como primeiro
secretário executivo do Cimi, eleito em Assembleia (1975), fez, com Egydio
Schwade, uma dupla temida pelos militares e poderosos da ditadura.
Por ocasião
dos assassinatos dos missionários do Cimi, Pe. Rodolfo e Simão Bororo (1976),
Pe. João Bosco Burnier (outubro de 1976), ele fez duras críticas aos mandantes
de tais crimes,”dando nome aos bois” – senadores, deputados, prefeitos,
vereadores e fazendeiros. Inclusive o governador do Mato Grosso. [...] Diante
desse quadro de insanidade e violência Iasi insiste em atitudes enérgicas e
decisivas: “Volto a insistir que somente uma intervenção federal pode resolver
o estado de violência no Mato Grosso... Só assim poderemos ver prestando contas
à Justiça aqueles que matam, mandam matar e ainda permanecem em liberdade” (
FSP 21/10/76). No final do texto “Y Juca Pirama - o índio aquele que deve
morrer”, do qual foi um dos principais redatores, consta:“O missionário jesuíta
Antonio Iasi Junior comentava: ‘os índios estão sempre levando a pior nessa
luta em defesa de seus interesses, chega assumir características de quando em
quando de tarefa insuportável. Sinceramente não sei por que existe tanta
insensibilidade, tanto egoísmo e tanta podridão entre os que se dizem, em alto
e bom som, como defensores dos índios” (Voz do Paraná 14/01/1974).
Iasi se
deslocou do Norte ao Sul do país identificando e denunciando as graves
violações dos direitos dos povos indígenas, especialmente na década de 70, “do
milagre brasileiro” e genocídio indígena. Seus relatórios são referências
importantes e contundentes até hoje.
Despedida e gratidão
“Leve meu abraço de
gratidão a todos os companheiros do Cimi e a todos os amigos”, disse-me ele, na
despedida. Isso dito de coração e com serenidade, deixa a gente emocionado e
comprometido com o belo gesto.
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Nós, do Cimi, somos muito gratos a esse missionário
indigenista, testemunha e batalhador destemido pela vida e direitos dos povos
indígenas do Brasil.
Egon Heck
Cimi –
Centro de Formação Vicente
Cañas, 17 de fevereiro de 2014.
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